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O CABOCLO &Eacute; NOSSO!

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O munic&iacute;pio de Cama&ccedil;ari e todo o Rec&ocirc;ncavo da Bahia, historicamente, &eacute; um territ&oacute;rio ind&iacute;gena. &Eacute; evidente o legado que herdamos de nossos ancestrais ind&iacute;genas, apesar de o processo de coloniza&ccedil;&atilde;o portuguesa e escraviza&ccedil;&atilde;o dos povos africanos ter transformado esse territ&oacute;rio em uma regi&atilde;o que det&eacute;m e emana forte identidade &eacute;tnica de culturas africanas e afro-brasileiras.

O conhecimento do protagonismo dos moradores do Rec&ocirc;ncavo Norte da Bahia, hoje parte da Regi&atilde;o Metropolitana de Salvador na Independ&ecirc;ncia do Brasil com destaque para o munic&iacute;pio de Cama&ccedil;ari e muito especificamente para a Vila de Abrantes, se deu a partir da publica&ccedil;&atilde;o do livro de nossa autoria intitulado A presen&ccedil;a do Rec&ocirc;ncavo Norte da Bahia na Consolida&ccedil;&atilde;o da Independ&ecirc;ncia do Brasil. Antes da publica&ccedil;&atilde;o dessa obra, o caboclo tupinamb&aacute;, Joaquim Eus&eacute;bio de Santa Anna, era um ilustre desconhecido. 

In&uacute;meros livros foram escritos e publicados tratando da Guerra da Independ&ecirc;ncia do Brasil na Bahia, mas nenhum desses autores e pesquisadores comentou sobre o capit&atilde;o-mor dos &iacute;ndios da Vila de Abrantes exceto o grande cronista da guerra, o &ldquo;pardo&rdquo; Ladislau dos Santos Titara, que, em seu c&eacute;lebre poema intitulado Paraguassu, narra os feitos da tropa patriota, ressaltando os distintos servi&ccedil;os prestados pelo capit&atilde;o-mor dos &iacute;ndios de Vila de Abrantes, Joaquim Eus&eacute;bio de Santa Anna.

Joaquim Eus&eacute;bio de Santa Anna foi um caboclo tupinamb&aacute;, natural da Vila de Abrantes, que participou ativa e intensamente desde o in&iacute;cio de todo o processo que culminou na expuls&atilde;o dos portugueses da Bahia e na Independ&ecirc;ncia do Brasil. 

De acordo com o dicionarista e especialista em l&iacute;ngua tupi Eduardo de Almeida Navarro, a palavra &ldquo;caboclo&rdquo; tem origem no termo tupi &ldquo;kuriboka&rdquo; que, inicialmente, se referia aos filhos de um ind&iacute;gena com uma africana e, posteriormente, essa express&atilde;o passou a se referir ao filho de m&atilde;e ind&iacute;gena e pai branco e, posteriormente, aos mesti&ccedil;os oriundos da miscigena&ccedil;&atilde;o entre caboclos e brancos. Na Bahia se tornou comum se atribuir o termo &ldquo;caboclo&rdquo; aos mesti&ccedil;os de ind&iacute;genas e negros empregando-se, &agrave;s vezes, como sin&ocirc;nimos de &ldquo;caboclo&rdquo; os termos cabo-verde, cabur&eacute;, cabra, cafuz, cafuzo e cariboca.

Joaquim Eus&eacute;bio de Santa Anna participou da Revolu&ccedil;&atilde;o Constitucionalista de 10 de fevereiro de 1821 em Salvador juntamente com outros dois ilustres moradores da Vila de Abrantes: o m&eacute;dico cirurgi&atilde;o, fil&oacute;sofo, matem&aacute;tico, jornalista de ideias iluministas e senhor do engenho de cana-de-a&ccedil;&uacute;car denominado Engenho Solid&atilde;o em Vila de Abrantes, Cipriano Jos&eacute; Barata de Almeida, e o tenente, Jos&eacute; Pedro de Alc&acirc;ntara, tamb&eacute;m senhor de um engenho em Vila de Abrantes denominado de Jenipapo. 

Esses tr&ecirc;s homens foram os principais respons&aacute;veis pela pris&atilde;o do coronel do Regimento de Artilharia da Bahia, Ant&ocirc;nio Luis Pires Borralho, em sua pr&oacute;pria resid&ecirc;ncia no Campo de S&atilde;o Pedro hoje denominado de Campo Grande, na Cidade do Salvador. Essa revolu&ccedil;&atilde;o foi um movimento de cunho popular de ades&atilde;o &agrave; revolu&ccedil;&atilde;o iniciada na Cidade do Porto, em Portugal, em 24 de agosto de 1820. 

Depois dessa a&ccedil;&atilde;o foi institu&iacute;do na Prov&iacute;ncia da Bahia, como resultado da Revolu&ccedil;&atilde;o Constitucionalista, um Conselho Interino de Governo e a Prov&iacute;ncia da Bahia enviou representantes para as Cortes Gerais Extraordin&aacute;rias e Constituintes da Na&ccedil;&atilde;o Portuguesa. O Brasil elegeu 51 parlamentares e, dentre os eleitos, destaca-se o cirurgi&atilde;o Cipriano Barata, que tomou posse em Lisboa como deputado brasileiro nas Cortes Gerais em17 de dezembro de 1821.&nbsp; 

O capit&atilde;o-mor dos &iacute;ndios Joaquim Eus&eacute;bio de Santa Anna, ap&oacute;s a Revolu&ccedil;&atilde;o Constitucionalista, atrav&eacute;s de um requerimento do pr&oacute;prio punho ao Conselho Interino de Governo da Bahia, solicitou que a C&acirc;mara de Abrantes cumprisse seu pr&oacute;prio regimento e efetuasse o pagamento em atraso do primeiro quartel da Vila de Abrantes em um gesto de autonomia e justa cobran&ccedil;a pelos direitos do grupamento de defesa da Vila de Abrantes.&nbsp; 

Na manh&atilde; do dia 19 de fevereiro de 1822 os militares portugueses invadiram o Forte de S&atilde;o Pedro e outros dois quart&eacute;is, localizados em Salvador, que alojavam tropas de brasileiros. O conflito no Forte de S&atilde;o Pedro foi o estopim para o in&iacute;cio da guerra. Os brasileiros foram derrotados e fugiram para se reagrupar em Vila de Abrantes e voltar para lutar em Salvador.

De acordo com Diarios das Cortes Gerais e Extraordin&aacute;rias da Na&ccedil;&atilde;o Portugueza, de 13 de agosto de 1822, p. 139, o deputado baiano, Cipriano Barata, em pronunciamento no dia 13 de agosto de 1822, nas Cortes Gerais em Lisboa, combatendo os discursos carregados de preconceitos dos portugueses e em meio aos conflitos entre brasileiros e lusitanos na Bahia, fez uma exposi&ccedil;&atilde;o enaltecendo a valentia dos povos ind&iacute;genas, negros e mesti&ccedil;os brasileiros. E entre outras personalidades brasileiras, ele citou, como exemplo de bravura, o capit&atilde;o-mor dos &iacute;ndios da Vila de Abrantes, Joaquim Eus&eacute;bio de Santa Anna, que foi morto em combate na Prov&iacute;ncia da Bahia pela causa patri&oacute;tica. 

Disse Cipriano Jos&eacute; Barata de Almeida,

&ldquo;[...] e at&eacute; em os nossos dias vimos o caboclo Eusebio de Santa Anna capit&atilde;o m&oacute;r da Villa de Abrantes, ser dos primeiros que obr&aacute;r&atilde;o na revolu&ccedil;&atilde;o constitucional na Bahia, em o dia 10 de Fevereiro do anno passado, ostentando o mais desmarcado valor. E oferecendo a vida pela salva&ccedil;&atilde;o da patria.&rdquo;

O capit&atilde;o-mor, Joaquim Eus&eacute;bio de Santa Anna, &eacute; um dos her&oacute;is das lutas pela Consolida&ccedil;&atilde;o da Independ&ecirc;ncia do Brasil na Bahia negligenciado pela historiografia oficial. Quando se faz refer&ecirc;ncia &agrave; figura dos caboclos, n&atilde;o podemos esquecer que a maioria desses guerreiros, que atuaram na guerra, eram oriundos da Vila de Abrantes, a primeira vila ind&iacute;gena do Brasil e tamb&eacute;m dos antigos aldeamentos do Rec&ocirc;ncavo Norte, a exemplo de Esp&iacute;rito Santo, Remb&eacute; (Arembepe), Barra do Pojuca, Monte Gordo, Capuame e A&ccedil;u da Torre, que desde o s&eacute;culo XVI eram arregimentados pela Casa da Torre de Garcia D&rsquo;&Aacute;vila para defesa da capitania e depois Prov&iacute;ncia da Bahia. 

Portanto, O CABOCLO &Eacute; NOSSO, &Eacute; DE CAMA&Ccedil;ARI! E esse deve ser o tema da passagem do Fogo Simb&oacute;lico em Cama&ccedil;ari no ano de 2024.

A comemora&ccedil;&atilde;o do Dois de julho esse ano completa 200 anos, pois a primeira vez que se celebrou a expuls&atilde;o dos portugueses da Bahia foi no 2 de julho de 1824 em Salvador, contudo a celebra&ccedil;&atilde;o do Fogo Simb&oacute;lico teve in&iacute;cio no 2 de julho de 1959, e est&aacute; completando 65 anos. O Fogo Simb&oacute;lico do Dois de Julho foi inspirado na Corrida de Revezamento do Fogo Simb&oacute;lico da P&aacute;tria criada em 1938, em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. 

O tema Dois de Julho, embora seja reconhecido como a data magna do Estado da Bahia, ainda &eacute; pouqu&iacute;ssimo discutido, divulgado e valorizado por nossas autoridades pol&iacute;ticas locais. &Eacute; inadi&aacute;vel, ou seja, &eacute; urgente a necessidade de que nossos atores pol&iacute;ticos, educacionais, culturais e todas as vertentes da sociedade civil se apropriem da tem&aacute;tica do Dois de Julho e fa&ccedil;am acontecer, na pr&aacute;tica, a prosa fluida de fortalecimento do sentimento de pertencimento. Por essa raz&atilde;o os gestores dos munic&iacute;pios do Rec&ocirc;ncavo Norte devem proporcionar ao seu povo uma festa &agrave; sua altura.

Depois da repara&ccedil;&atilde;o hist&oacute;rica conquistada arduamente como resultado de nosso trabalho, todos os anos, no dia 30 de junho, o Fogo Simb&oacute;lico do Dois de Julho sair&aacute; de Mata de S&atilde;o Jo&atilde;o passando pelos munic&iacute;pios de Dias D&rsquo;&Aacute;vila, Cama&ccedil;ari e Lauro de Freitas e, no dia 1&ordm; de julho, se fundir&aacute; ao Fogo Simb&oacute;lico de Cachoeira no munic&iacute;pio de Sim&otilde;es Filho, que outrora a localidade era denominada de &Aacute;gua Comprida e sediou o quartel general das tropas brasileiras.&nbsp; 

<img alt="" src="/fotos/artigos/115/mg/3..jpg" style="float: left; width: 278px; height: 300px;" />Diego de Jesus Copque &ndash;&nbsp;<a href="mailto:diegokopke@gmail.com" style="color:blue; text-decoration:underline" target="_blank">diegokopke@gmail.com</a>&nbsp;&eacute; professor, historiador, pesquisador da hist&oacute;ria da Bahia, s&oacute;cio efetivo do Instituto Geogr&aacute;fico e Hist&oacute;rico da Bahia e autor dos livros&nbsp;Do Joanes ao Jacu&iacute;pe: uma hist&oacute;ria de muitas querelas, tens&otilde;es e disputas locais&nbsp;e&nbsp;A presen&ccedil;a do Rec&ocirc;ncavo Norte da Bahia na consolida&ccedil;&atilde;o da Independ&ecirc;ncia do Brasil.&nbsp;

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